terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

MÁXIMAS DO ESTADO PARA AS MONARQUIAS

As monarquias conservam-se igualmente pelos meios contrários às causas da sua ruína. Quanto menos coisas houver submetidas à autoridade absoluta dos reis (que são portanto menos imperiosos, mais iguais aos seus súbditos e menos odiosos), mais duradoura será a sua autoridade.

O recurso ao rigor

As tiranias conservam-se de duas maneiras opostas: com o rigor mas também com a moderação.
No método do rigor abaixam-se as personagens mais eminentes e semeia-se a discórdia entre os amigos; empobrecem-se os cidadãos, a fim de que não possam formar guarda armada e que, absorvidos pelos trabalhos de que têm necessidade para viver, não tenham tempo para conspirar e aumenta-se o peso dos impostos. Recorre-se à guerra, a fim de que os súbditos fiquem ocupados e dependentes de um general e usam-se recursos da democracia extrema. No fim, podemos reduzir estas tácticas a três meios: conservar os súbditos no mais completo aviltamento, criar-lhes desconfiança de uns em relação aos outros e não lhes deixar nenhum poder.

Uso da moderação

No método da moderação o objectivo é, essencialmente, salvar as aparências. Assim, evitam-se despesas que ferem o povo, que se abstém de fazer liberalidades; prestam-se contas do recebimento e do emprego dos impostos e aparenta-se não aumentar os impostos. O tirano escolhe tornar-se acessível aos seus súbditos e mostra um ar de gravidade com a sua boa educação; o país é embelezado a fim de se mostrar o belo da região. As pessoas bem e talentosas são honradas e o tirano abstém-se de qualquer injúria, que pode ter duas espécies: ferir quem quer que seja e desonrar a juventude.

DAS LEIS OU PRÁTICAS SALUTARES ÀS REPÚBLICAS

É próprio de um legislador e de qualquer pessoa que soube traçar o plano de um governo não somente realizá-lo, mas também conseguir a permanência da sua obra.

O respeito das leis e da honestidade

Num Estado bem ordenado nada se faz contra as leis e os costumes e tem-se atenção aos abusos; esta atenção deve incidir com não maior vigilância sobre as armadilhas que se armam ao povo que é ludibriado pelos ricos em cinco ocorrências: exercícios, assembleias, magistraturas, julgamentos e armamento. As formas de ludibriar o povo nestas ocorrências é bastante subtil: nas Assembleias dá-se permissão para toda a gente a elas assistir mas castigo contra os ricos se não assistirem; desta forma o povo deixa-se levar pelo ócio e torna-se faltoso, enquanto os ricos mais não estão que a tomar as decisões por eles ao serem obrigados. Nas Magistraturas os que têm rendimentos são proibidos de as recusar, mas os pobres podem fazê-lo; de novo o povo ocioso deixa-se levar pelo aparente conforto e cede os seus poderes aos ricos obrigados. Nos Julgamentos há castigo contra os ricos que se recusem a ser juízes e impunidade para os pobres; a consequência é a mesma. Nas Armas há uma legislação igual sobre elas e os exercícios, sendo que os pobres têm permissão para não possuírem armas mas os ricos são castigados se não as tiverem. Finalmente nos Exercícios não há nenhum castigo contra os pobres que não participam e castigo para os ricos se faltam a eles.
Pelo contrário, nas democracias, os legisladores usam também subtilezas contrárias pois a eles interessa que o poder esteja no povo: propõem um salário aos pobres que assistem às assembleias ou que exercem o cargo de juízes para incentivar o povo a tomar esses postos e não dão castigos aos ricos que disso se abstiverem, sendo estes nesta situação facilmente seduzidos pelo ócio.
Todos estes expedientes são funestos nas repúblicas.

Outras práticas benéficas

Existem aristocracias e oligarquias que se sustentam menos pelo valor da sua Constituição que pela conduta moderada daqueles que a governam.
A igualdade que os homens popularmente afectam perante a multidão não é somente justa no Estado democrático, é-o em toda a parte, entre semelhantes. Os iguais formam um povo entre si.
As boas instituições conservam-se pelo afastamento do que as pode corromper e pela suposição de um perigo próximo. O temor obriga a ter em maior atenção a segurança do Estado. É preciso também providenciar através de leis ou velar para que não apareçam animosidades e sedições entre os grandes.
Os homens, contudo, corrompem-se facilmente pela prosperidade, porque nem todos são capazes de a suportar; assim, é regra geral que em qualquer governo não se deve exaltar demasiado quem quer que seja nem distribuir nenhuma honra excessiva e que não convém dar ocasião através das leis a que alguém adquira demasiado poder, crédito ou fortuna. Assim, é uma necessidade estabelecer um magistrado para observar todo o género de vida que iria contra a forma e o espírito do governo.
Em toda a política não existe máxima mais importante do que providenciar para que as magistraturas não sejam lucrativas. A pessoa vulgar fica menos irritada em se ver excluída do governo do que em ver os magistrados viverem à custa do tesouro público.
Esta gratuidade é a única maneira de aliar a democracia à aristocracia. Dá aos nobres e às pessoas vulgares o que desejam. Admite, sem qualquer distinção, toda a gente no governo e só dá as magistraturas aos nobres.
Nas democracias é preciso distinguir os ricos e não submeter nem as suas posses nem os seus réditos a nova partilha, como se faz secretamente nalgumas repúblicas.
Nas oligarquias é preciso ter um grande cuidado com os indigentes e distribuir-lhes empregos lucrativos.
É bem, quer na democracia quer na oligarquia, que aqueles que menos participam no governo, como sucede com os ricos na democracia e com os pobres na oligarquia, sejam, em todas as outras coisas, tratados igualmente, a não ser que se trate da suprema autoridade que deve ser reservada àqueles que a forma de governo indicar.

O desinteresse

Os que levam a peito a salvação do Estado, em lugar de se apoderarem, em proveito do povo, dos bens dos condenados, devem consagrá-los à religião. O povo mostrará menos pressa em condenar, uma vez que não tira qualquer proveito da sentença. Os legisladores devem também tornar muito raras as acusações públicas, estabelecendo penas graves contra aqueles que agem levianamente.
É preciso inspirar a toda a gente afecto pelo governo e evitar que os grandes sejam considerados como inimigos. Nas últimas espécies de democracia o povo é numeroso e quase não é possível a toda essa gente assistir às assembleias sem retribuição; isto leva a um empobrecimento do Estado e consequente aumento dos impostos, subvertendo a democracia... e quando o Estado tem finanças reduzidas, não se devem convocar assembleias nacionais senão muito raramente.
Um homem verdadeiramente popular deve providenciar para que o povo não seja demasiado pobre, pois a miséria é a fonte de todos os males na democracia.
É preciso encontrar uma maneira de toda a gente desfrutar dum nível de vida aceitável. Os ricos deverão contribuir para as despesas das assembleias necessárias, em vez de se dedicarem a gostos frívolos e puramente faustosos, pois tal só mostra um grande senso e alma nobre.

A virtude e a educação

Os chefes de governo precisam de ter três qualidades necessárias: dedicação à Constituição actual do Estado, meios habilidade adquirida no desempenho e exercício das funções governamentais e virtude e justiça de acordo com o regime; aliás, não sendo o direito o mesmo em todas as Constituições, também a justiça deve ser necessariamente diferente. Surgem dificuldades quando todas estas qualidades não se encontram na mesma pessoa. Assim, há que ter em conta os fins para que se destina cada cargo e atribuí-los às pessoas que correspondam às capacidades necessárias.
Entende-se por interesse público tudo o que é regulado pelas leis para a conservação do Estado. O seu ponto essencial é fazer de maneira a que a parte satisfeita do Estado presente seja mais poderosa do que a que não está contente. Os meios para o conseguir, contudo, podem ser populares (corrompendo as democracias) ou oligárquicos (corrompendo as oligarquias), tanto que toma-se muitas vezes como virtude o que é excessivo.
A oligarquia e a democracia podem subsistir ainda que afastando-se do seu desígnio e da sua perfeição. Mas se se dá demasiada extensão ao seu princípio, começará por se tornar o pior governo. Cometem-se grandes faltas tanto num como noutro regime. Nas democracias é um erro dos demagogos tornar a multidão senhora das leis. Nas oligarquias, os oligarcas cometem o mesmo erro tomando muito a peito o interesse dos ricos.
O mais importante meio de conservação dos Estados é harmonizar a educação dos cidadãos com a Constituição. Se se trata de uma Constituição popular, que os cidadãos sejam educados duma forma popular; se se trata de uma Constituição oligárquica, que os cidadãos sejam educados oligarquicamente. Educar os cidadãos em consonância com o Estado não é lisonjear os grandes ou o povo, nem querer agradar-lhes, mas sim habituar os cidadãos a manter a sua oligarquia ou a sua democracia.